Desde a primeira vez que pisei em Lima tenho, diariamente, a grande oportunidade de aprender algo novo a respeito do mundo gastronômico – temperos, chefs, sabores, ingredientes, mercados e, lógico, restaurantes. Sempre tive um carinho especial pelo antigo Astrid y Gastón, não só pela comida e ambiente ímpares, mas também por ter sido um dos primeiros lugares onde o marido (na época, namorado) me levou quando vim visita-lo pela primeira vez, lá em 2010. Tivemos um jantar lindo, saboroso e surpreendente, diferente de tudo o que já havíamos experimentado.
A cada vez que eu retornava àquele lugar, revivia um pouco daquele momento tão particular, onde eu fui apresentada à cidade que viria morar pouco mais de um ano depois. Sou de uma família descendente de espanhóis e italianos, e crescemos em volta de uma mesa, é inevitável conectar comida ao afeto! Acredito que só é possível ter uma boa refeição quando estamos cercados de boas energias e companhias agradáveis, então essa ligação pra mim é instantânea e automática, trazendo boas ou más recordações.
Eu sei que tudo isso soa bem nostálgico e, na real, era mesmo. Independente de todas as maravilhosidades que poderiam sair daquela cozinha, eu tinha uma relação afetiva com o lugar, como muitos de seus frequentadores locais, acredito eu. Quando anunciaram que ele fecharia e que abririam um novo restaurante, com novo conceito, na Casa Moreyra (casona antiga que faz parte da história de Lima), decidi acompanhar as notícias para saber mais a respeito das mudanças. Tentei não me deixar influenciar pelas críticas que li após sua abertura, de forma que prolonguei ao máximo a minha ida ao novo Astrid y Gastón Casa Moreyra, temendo não encontrar nenhum resquício de seu precursor, tão marcado na minha história.
Vale ressaltar que as críticas advinham da grande mudança proposta por Gastón e Astrid, respaldada pelo talentoso chef Diego Muñoz, quem assumiu o comando deste desafio imenso. O que antes era um restaurante abrigado numa porta tímida da rua Cantuárias, passou a imponente Casa Moreyra, onde há uma oficina, espaços privativos, jardins, hortas, 6 cozinhas e dois restaurantes abertos ao grande público – o La Barra e o Astrid y Gastón – de conceitos novos e independentes de seu homônimo antecessor.
La Barra Casa Moreyra é o lugar onde podemos pedir a la carte num ambiente informal, é bar, é comida compartilhada, drinks, música e descontração privilegiando a tertúlia. Já Astrid y Gastón Restaurante serve única e exclusivamente o seu menu degustação, em um salão exclusivo com apenas 7 mesas, onde a estrela é, indiscutivelmente, a comida.
Conseguimos uma reserva para o AyG Restaurante numa quarta-feira na hora do almoço. Fomos recebidas e levadas ao pátio interno, típico das casas espanholas antigas, como esta. A casa está linda, reformada e restaurada, e faz desse ambiente externo uma sala de recepção despretensiosa e aconchegante. Ali já nos serviram um drink e entradas, destaque para a ‘anchoveta en salazón’ e o brioche com azeitonas e queijo de cabra.
Em seguida nos levaram conhecer a cozinha – onde pudemos tirar uma foto com o chef Diego – e depois passamos ao salão principal. Amplo, arejado e confortável. O menu degustação é inevitavelmente um longo ritual, onde a cada prato se trocam talheres e louças, e as explicações do que está à sua frente se desprendem em tantos detalhes que fica difícil crer que vamos conseguir perceber tudo aquilo naquele único prato. Até o momento em que provamos. Sabores acentuados, pontos de cozimento ideais, texturas de contraponto, acompanhamentos primários e aromas deliciosos que fazem jus ao complexo trabalho do chef e seus cozinheiros.
Obviamente que num menu tão extenso como esse, de 23 tempos, existem alguns pratos que agradam mais do que outros. Comemos tudo, mas foi unânime nossa preferência pelo pisco suor desconstruído, pelas vieiras com tomate, parmesão e menta, pelo cebiche vegetal de abacate, pelas batatas cozidas na terra com molho huancaína e pelo entrecote perfeito. As sobremesas suntuosas e delicadas são um espetáculo à parte. Pausa para o ‘huevo chimbo‘, que tem cara de ovo cru mas na verdade é um doce de maçã, uvas, lima e amêndoas. De chorar. O tempo todo nos sentimos acarinhados e mimados diante do cuidado e atenção recebidos. Isso é importante pois, por mais que não pareça, a experiência é um pouco exaustiva. Tantas são as informações e os sabores, que a atenção prestada aos clientes se torna imprescindível para que tudo seja aproveitado ao máximo. E eles sabem disso e o fazem como ninguém.
Daí você me pergunta: “Mas e a minha expectativa em relação ao antigo restaurante? E todo o ‘trelele’ que falei no começo do post? Consegui reconhecer as minhas memórias afetivas nesse novo lugar tão espetacular?”. Não. São lugares diferentes e ambos têm as suas qualidades, o primeiro com ciclo já completo e o segundo iniciando uma empreitada. O novo Astrid y Gastón Casa Moreyra, que ocupa a segunda posição no ranking dos melhores restaurantes da América Latina, representa uma mudança no cenário gastronômico. E mudanças são sempre difíceis, mas trazem consigo um recomeço. Gostei de conhecer esse novo cenário e estou certa de que a Casa Moreyra, tão importante para a Lima que me acolhe, pode marcar não só as minhas, mas a memória de muita gente através deste restaurante.
Onde?
Astrid y Gastón Casa Moreya
Av. Paz Soldan, 290 – San Isidro
Reservas no site www.astridygaston.com
3 Comments
Conexão em Lima: o que fazer? - Cup of Things
03/07/2015 at 21:13[…] os que querem viver uma experiência gastronômica especial, o Astrid y Gaston pode ser sua melhor opção. Claro que previamente reservado. A degustação dura aproximadamente […]
Jader
13/06/2015 at 23:15Deu água na boca só de ler!
Diego Muñoz, o chef do Astrid y Gaston. - Cup of Things
11/06/2015 at 12:43[…] o país latino-americano com maior representação na lista. O Central chegou a quarta posição, o Astrid y Gastón ficou com a 14a. e o Maido estreou com a 44a. […]