6 In Gastronomia/ Lima/ Peru

Diego Muñoz, o chef do Astrid y Gaston.

Diego Muñoz no Astrid y Gaston
Diego Muñoz no Astrid y Gaston

Nós com Diego Muñoz em uma das cozinhas do Astrid y Gastón.

Na primeira segunda-feira de junho, dia 01, a revista britânica “Restaurant” divulgou a lista dos 50 melhores restaurantes do mundo. Esta é hoje a lista mais importante e reconhecida no setor. O Brasil foi representado pelo DOM e Maní, ambos em São Paulo, e o Peru foi o país latino-americano com maior representação na lista. O Central chegou a quarta posição, o Astrid y Gastón ficou com a 14a. e o Maido estreou com a 44a. posição.

Antes da lista sair, tivemos o prazer de conhecer o novo menu degustação do Astrid y Gaston e aproveitamos para conversar um pouco com o chef da casa, Diego Muñoz, responsável pela ascensão e sucesso atual do Astrid y Gastón.

Já havia visto Diego algumas vezes, é comum vê-lo circulando pelo restaurante, normalmente sério e concentrado. Encontrá-lo para esta entrevista foi uma surpresa. Diego Muñoz se mostrou tímido, mas extremamente simpático e gente boa. Sem pressa, nem estrelismo, ficou conosco sem se preocupar com tempo, limitações de número de perguntas e, muito menos, censura. Extremamente sincero, falou sobre suas vitórias, mas também dificuldades e estresse que envolve o desafio de assumir o restaurante mais famoso do país, o Astrid y Gastón.

Antes de fazer gastronomia estudava engenharia industrial. O que te fez mudar?

O que me fez mudar foi ver que eu era o último da classe de engenharia industrial (risos). Era bem jovem também e aqui se entra na universidade logo depois da escola e não tem idéia do que vai fazer. É escolher uma carreira e segui-la. Então me dei conta que não era a minha e decidi ser cozinheiro profissional. Não tinha muita referência de cozinheiros profissionais no Peru e, sobretudo, não havia uma carreira de cozinheiro como algo seguro. Em 1998, comecei aqui com 21 anos. Já um pouco tarde para um cozinheiro, mas antes tarde do que nunca. Sim, aí passei de último da escola de engenharia para ser o primeiro na escola de cozinha. Tinha muito mais interesse, muito mais gosto, leia tudo que podia, trabalhava tudo que eu podia. Fui ao Le Cordon Bleu Canadá (famosa universidade de culinária), porque na época não havia aqui e eu não sabia francês. Então fui ao Canadá para depois ir a França. Cheguei em Paris sem falar nada e meus amigos canadenses que traduziam tudo para mim e passado 3 dias pensei: “sabe o que? Isto é a minha vida!” e assim terminei em primeiro também na França sem falar francês. Era pra ser.

Mas antes de optar como carreira, quando adolescente/jovem gostava de cozinhar?

Sim, era super curioso pela cozinha, sempre escolhia um livro e fazia algo. Não era um obcecado pela cozinha, nem minha família era. Não era comum meu pai nos levar a restaurantes. Quando ia a um restaurante, era, para mim, acontecimento e, quando ia na casa de um amigo de outra cultura como a chinesa ou japonesa, era emocionante ver o que eles comiam.

E do Brasil? Conhece algo da gastronomia brasileira? Tem algum prato que ficou na sua lembrança.

Sim, claro. Me lembro de uma vez em Manaus, comi na rua uma sopa apimentada de camarões da selva (o nome do prato é Tacacá). Estive em Belém também, adorei. Em Rio comi de tudo. Estive muito em Brasil, mas não por muito tempo, estava sempre navegando na costa brasileira (ele era chef do restaurante Silver Wing, no cruzeiro Silversea). Tenho muitos bons amigos no Brasil.

Até 2012, Astrid y Gaston ocupava a 42a posição entre os melhores restaurantes do mundo. Após sua chegada conquistou 14a e 18a posição, 2013 e 2014 respectivamente. Gastón (Acúrio, famoso chef peruano e um dos donos do Astrid y Gastón) sabia o que estava fazendo quando te trouxe da Austrália. Como se sentiu quando seu trabalho se confirmou como um diferencial em um dos restaurantes mais famosos do mundo e pertencente ao chef mais conhecido país. O sentimento foi parecido ao que teve quando alcançou o sucesso do Bilson’s (famoso restaurante australiano)?

O de Bilson’s foi incrível porque em 3 meses conseguimos estar na capa da revista com uma nota 18 de 20, uma das coisas mais difíceis , foi uma revolução. Aqui, bem, eu senti por toda a equipe, porque estávamos em um processo de adaptação. Eu regressei ao Peru para este projeto (Astrid y Gaston Casa Moreyra), estive em Austrália até 2011 e o primeiro que fiz foi estudar a casa. É uma grande responsabilidade e uma grande honra também. O restaurante trabalhava de um jeito e eu cheguei trabalhando da minha forma. Sou muito disciplinado, rígido, porque acredito que é assim que se produz as coisas boas, não no caos e na desordem. Eu cheguei e em alguns meses, metade da equipe se foi, porque não estavam acostumados a trabalhar com esta rigidez. O resultado veio no meio de tudo isto. Não esperávamos, mas é um resultado de toda a equipe, sem dúvida.

Com toda divulgação atualmente da gastronomia, chefs como superstars e a lista dos melhores restaurante sendo amplamente comentada, gostaria de saber se, de alguma forma, esta “competição” para estar na lista dos melhores pauta seu trabalho.

Não, felizmente. Bom, não sei se felizmente, mas eu canalizo minha energia, minha atenção a não pensar tanto nisso. Não acredito que somos melhores que o restaurante que está no posto 50. É imensurável. E também não acredito que o número 1 se sinta superior. Cada restaurante é uma experiência. Alan Ducasse não está na lista dos 50 (retornou este ano) e para mim é o melhor. Eu percebo o prêmio assim, como algo temporal, com muitos fatores de influência, lobby, mas claro que fico feliz com o reconhecimento, como qualquer um ficaria. Principalmente em um país que sofreu tanto, o que se necessita agora são triunfos, sucessos. Estar na lista para que as pessoas se motivem, para ter força para seguir adiante. Isto me motiva, a repercussão que podemos criar dentro de um país, mais por isto, que por gratificação própria.

Você fala com tanto carinho do país, com tanta paixão pelo que pode realizar aqui. Sempre foi um plano voltar para o Peru ?

Não, para este momento não. Foi uma oportunidade de regressar. Estava feliz na Austrália, sou residente australiano. Era um grande convite, uma empresa muito séria, em um projeto muito interessante. Tudo isto contou.

E se apaixonou novamente pelo seu país? Depois de tanto tempo já havia perdido muito de sua ligação com o Peru?

Sim, muito. Logo que regressei, me sentia, muitas vezes, muito mais estranho aqui que na Austrália, porque meus amigos já tinham seguido a vida e por muitas vezes não tinha a quem telefonar, mesmo estando em sua casa! Mas sou super volátil. Eu viajo tanto, passei tantos anos viajando e morando em tantos países que já não me apego. Adoro o Peru, mas minha família também já não mora aqui. Bom, agora já me casei, tenho uma esposa, uma família e este agora é meu mundo.

Você cozinha em casa para sua esposa?

Bem pouco. As vezes quando convidamos alguém no domingo, faço algo bem simples. Mas atualmente estou bem pouco em minha casa, vivo hoje para o restaurante. São como 140 filhos aqui. (risos)

Falando um pouco sobre os alimentos hoje utilizados na cozinha, a valorização do alimentos orgânicos, a preocupação com a origem e os fornecedores. Qual é sua opinião sobre isto?

Aqui temos a sorte que nossos camponeses seguem as práticas orgânicas e de cuidado faz séculos. É uma ótima tendência, é importante que as pessoas estejam se preocupando em comer melhor. Tudo é cíclico. Demos uma grande volta para regressar ao início. É a natureza humana. No Peru, tem dezenas de lugares orgânicos que não se preocupam em fazer sucesso ou em ser famoso. Mas aqui, antes de pensarmos em comer orgânico, temos que pensar também em dar a milhares que ainda não possuem o que comer. Estamos falando de um país gastronômico, mas que sua gente ainda passa fome. É complicado.
Eu penso que tudo que torne as coisas mais horizontais para a sociedade são benvindas. Eu não curto modismos. Não critico, mas não é pra mim.

Sentimos muito a diferença entre os dois restaurantes Astrid y Gaston (Cantuárias e Casa Moreyra). Hoje ele é outro. Outra filosofia, outra estrutura, outro público. Uma mudança radical.

Sim, foi uma difícil adaptação. Acredito que até agora está difícil. É um problema conceitual grande. Não temos ainda o respaldo da comunicação para explicar a mudança para os clientes. Foi um ano difícil. Teve muita gente que veio aqui não querendo o menu degustação e foi ao La Barra (restaurante também na Casa Moreyra), achando que também era Astrid y Gaston, mas “a la carte”. Se você vai ao Tripadvisor, estamos como número 16, mas você observa e vê que estão falando do La Barra. Agora estamos tratando de fazer dois websites separados, dois conceitos bem marcados.

Foi realmente uma surpresa pra gente, quando visitamos o La Barra. Pensávamos que encontraríamos o Astrid y Gaston da rua Cantuárias. Não esperávamos algo tão informal.

Não, esqueça! Com um monte de gente foi assim. No início as senhoras chegavam aqui com uns super penteados, os senhores bem vestidos. La Barra é um restaurante informal, com barulho, comida simples. Poderia estar em qualquer outro bairro, no Barranco.

Falando agora sobre o menu degustação que acaba de mudar. A idéia é alterá-lo a cada três meses?

Não. Até semanas atrás fizemos seis histórias de menu. Foram seis menus criados a partir de histórias, mas isto fazia com que ficássemos presos e não podíamos mudar as elaborações. O que fizemos agora foi procurar uma referencia próxima, que é a região de Lima, que move a cidade de Lima, com muito mar, muitos camponeses e a idéia é explorá-la pelos próximos dois anos. O menu tem uma estrutura, mas não um prato fixo que ficará seis meses, por exemplo. Estamos em constante adaptação. Agora colocamos três pratos novos em duas semanas. O menu será de acordo com a investigação da região, através de viagens e experiências.

Li que a partir de agora as mudanças se darão também de acordo com o que vocês tem na cozinha, podendo ter adaptações diárias ao menu.

Sim, hoje por exemplo não temos molusco navalha/ lingueirão, então colocamos lula. Vocês comerão lula.

É estressante, um desafio diário…

Sim, muito, principalmente porque estamos em adaptação, mas o objetivo é ter tudo planejado. Saber antecipadamente quando nos acabará o produto para termos já preparado o prato substituto, mas agora é um estresse total. Perdi muito peso já… (risos)

Qual seu hobby, onde você relaxa de tudo isto que vive aqui?

Surfo. O mar me cura. Ele me dá energia para chegar aqui todos os dias de manhã e superar os desafios do dia.

www.astridygaston.com
Siga o instagram @diegomunozperu

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6 Comments

  • Reply
    Juliana
    12/06/2015 at 10:39

    Oi Manu!! Adorei o blog.. Super bacana.. Essa é minha primeira visita, fiz questão de deixar um comentário pra dizer que gostei muito do seu blog e que vou voltar mais vezes, com certeza! E quem sabe a gente não conta com uma contribuição sua para o nosso blog qualquer dia desses? Beijo :*

    • Reply
      Manu Tessinari
      16/06/2015 at 18:48

      Obrigada Ju!

      Sou toda enrolada, mas seria um prazer, viu? Vamos combinar!

      bjs
      Manu

  • Reply
    Dora
    11/06/2015 at 16:51

    Manu e Bia amei a entrevista, fantástica. Beijos Parabéns!!

    • Reply
      Manu Tessinari
      11/06/2015 at 17:23

      Obrigada, querida.

      bjs,
      Manu

  • Reply
    Evanice
    11/06/2015 at 14:11

    Adoro o Blog !!! Estou passando um tempo em Lima e curtindo muito as dicas de vcs!!!

    • Reply
      Manu Tessinari
      11/06/2015 at 17:23

      Que bom! A gente fica feliz… 🙂

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